Cultura - Educação

Homens Meridianos por Luiz Cláudio Jubilato

24 de Novembro de 2014
Luiz Cláudio Jubilato
Prof. de Língua Portuguesa

 

 

 

 

 

 

 

AVC – Aprendendo a Viver Construindo.

AVC – Aprendendo a Voar Caindo.

AVE – Aprendendo a Viver Ensinando.

 

DESAFIO: As águias atiram seus filhotes no abismo. Começa o ritual da iniciação. Só assim, confrontados com a morte, aprendem a voar. Por um curto período de tempo, os filhotes recebem a comida na boca. Basta dar os primeiros passos e abrir as asas, a mãe águia os ensina a caçar. Viverão para sobreviver, defender seu território, acasalar. Voos, cada vez mais altos, alcançarão.

 

Desafio: As mães humanas também põem comida na boca de seus filhos, até muito tempo depois de eles aprenderem a andar. Se deixá-los sozinhos, será pior que atirá-los no abismo, não sobreviverão. Desde crianças, os pais as empurram em direção aos altos voos. Elas serão equipadas para serem invejadas. Terão a obrigação de vencerem na vida. O ritual só ocorrerá aos 18 anos, ao prestarem o famigerado vestibular. Aí sim, adquirirão garras, metas grandiosas a conquistar: fama, beleza, riqueza. Aprenderão a ser predadores, a nunca fraquejar.

 

 Desafio: Viverão com medo, estresse, depressão, ansiedade. Não lhes será dado o direito de fracassar. Suas asas e muletas serão os ansiolíticos, os antidepressivos, os moderadores de apetite, os cosméticos, a bajulação. As amizades sinceras, a diversão, a convivência com a família não importarão. O negócio é viverem aplaudidos diante do sucesso. A educação dos filhos ficará a cargo da escola, do porteiro do prédio, do motorista da van, dos avós, a empregada, da internet e até da televisão.

 

Desafio: Vem o punho da morte que, num piscar de olhos, faz a vida virar abismo. Pior, executivo, executado, não sabe voar. Os “amigos” somem. Sucesso toma outro significado, agora se torna sinônimo de esperar. Os dias se limitam a tentar falar, ganhar equilíbrio, andar, mexer, no mínimo, o dedo mindinho. O predador volta a ser bebê. Alguém precisa alimentá-lo e, se fizer cocô, alguém tem de limpar-lhe a bunda. Os valores se invertem, acabam os pudores. O paciente vira paciente, dependente.

 

Desafio: Como só vemos, quando queremos ver, a verdade, por vezes, mente. Não é nada fácil convencer o predador de que precisa se reinventar. Há limitações. Não um analgésico. Voltar transforma-se em obsessão, tortura, desafio. Vê-se, com o passar das noites, perdido numa luta inglória, como atravessar um rio a nado, sem saber nadar. Faz dos psicoterapeutas, remédios; dos médicos e fisioterapeutas bengalas. Vibra, como uma criança diante de um brinquedo, quando o fonoaudiólogo lhe ajuda a balbuciar algum som. O rápido acabou.

 

Desafio: Cremos, no entanto, que nunca há muros suficientemente fortes capazes de nos parar, nem obstáculos tão espinhosos capazes de nos arranhar. Nascemos num planeta cortado ao meio pelo meridiano de Greenwich. Cada um de nós é parido partido ao meio. Essas partes tão díspares partem de uma única raiz. O cérebro, raiz frutífera, cuja seiva compensa deficiências exacerba os sentidos. Nossos pais nos levam a divisar o branco do preto, a felicidade da tristeza, o açúcar do sal.Temos de nos convencer a todo instante que, para darmos passos sozinhos, temos de costurar essas partes.

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