Cultura - Teatro

Com fones de ouvido público faz passeio sensorial pelo Parque Trianon em montagem do Teatro Kunyn

29 de Junho de 2015

O Teatro Kunyn estreia dia 10 de julho, sexta-feira, às 15 horas, no Parque Trianon, sua segunda montagem –ORGIA OU DE COMO OS CORPOS PODEM SUBSTITUIR AS IDEIAS. Com direção de Luiz Fernando Marques, do Grupo XIX, o espetáculo é inspirado no livro Orgia: Os Diários de Tulio Carella, Recife 1960. O elenco, formado por Ronaldo Serruya, Paulo Arcuri e Luiz Gustavo Jahjah, tem o apoio de mais outros 10 atores que foram escolhidos por meio de uma oficina. O projeto foi contemplado com o Programa Municipal de Fomento ao Teatro da cidade de São Paulo.

 
 

Dividido em três atos, o espetáculo – encenado apenas para 21 pessoas por sessão com ingressos gratuitos – se apresenta para a plateia como um grande percurso, um jogo, que ela percorrerá ora sozinha, ora acompanhada, ora conduzida pelo atores, ora deixando-se levar por sua própria intuição e coragem. 

 

Em 1960 Tulio Carella viajou ao Recife contratado como professor de direção e cenografia da Universidade Federal de Pernambuco. Seus dois anos na capital pernambucana foram registrados no livro Orgia, publicado no Brasil em 1968 por José Álvaro Editor, com tradução de Hermilo Borba Filho. No livro Carella assume o heterônimo de Lúcio Ginarte, que vive aventuras sexuais com anônimos populares e transita pelas rodas intelectuais pernambucanas, o que chamou atenção de João Silvério Trevisan, que dedicou um capítulo a Carella em Devassos no Paraíso, publicado em 1986 pela editora Max Limond e reeditado em 2000 pela editora Record.

 

Esquecido e ainda inédito na Argentina, Orgia foi reeditado em 2011 pela editora Opera Prima, resgatando as polêmicas em torno do livro. De volta à Argentina em 1962, Carella passa a viver mais ou menos afastado dos círculos literários e teatrais, falecendo em 1979, em decorrência de problemas coronários, aos 66 anos.

 

Três momentos dentro do Parque Trianon

Para o Teatro Kunyn, a escolha de um espaço não convencional para suas encenações sempre ultrapassou a questão do espaço como dramaturgia. A primeira montagem do grupo, Dizer e não Pedir Segredo era encenada em apartamentos. “Falar do tema do espetáculo na sala de jantar era mais importante do que possíveis micro dramaturgias que aquele espaço poderia carregar”, conta Luiz Fernando Marques, diretor da montagem.

 

Neste sentido, ORGIA OU DE COMO OS CORPOS PODEM SUBSTITUIR AS IDEIAS trabalha com a ideia do externo e do interno, do dentro e do fora. “Pode-se dizer que trabalhamos com a ideia do espaço como um estado, como uma experiência, por isso a escolha do parque como local de encenação. Por ser um espaço híbrido e de transição permitirá o deslocamento da plateia, proporcionando a mesma um caminho, uma trajetória e uma deriva tal qual a vivida pelo nosso herói em sua jornada ao encontro de si mesmo.”, explica o diretor.

 

A itinerância é à base da encenação do espetáculo, que começa dentro de uma casa, encravada dentro do Parque Trianon e atual sede da administração. Lá o público conhece melhor o personagem principal, interpretado pelos atores Ronaldo Serruya, Paulo Arcuri e Luiz Gustavo Jahjah. Depois a plateia é convidada para um passeio pelo parque e munida de aparelhos de MP3 faz uma jornada sensorial. Nessa etapa há a participação de 10 atores que se misturam aos frequentadores do parque. O público então volta a casa, mas dessa vez é levado ao porão, onde termina o espetáculo.

 

ORGIA OU DE COMO OS CORPOS PODEM SUBSTITUIR AS IDEIAS tem dramaturgia dos próprios componentes do Teatro Kunyn nas duas primeiras partes da montagem. O terceiro e último ato tem dramaturgia assinada por Alexandre Dal Farra, do grupo Tablado de Arruar.

 

Provocações

Durante o processo da montagem do espetáculo, o grupo contou com três provocadores teóricos em três searas: atuação, dramaturgia e encenação, que acompanharam a criação da peça em momentos diferentes do processo e atuaram com suas experiências e vivências de modo direto na construção da montagem, dilatando assim o fazer teatral do grupo.

 

Na área de dramaturgia, a provocação foi realizada por Alexandre Dal Farra. Na área de encenação, a provocação ficou a cargo de Edgar Castro, coordenador da Área de Teatro do CLAC/Centro Livre de Artes Cênicas e ator fundador da Cia Livre e na atuação, a provocação foi feita por Miwa Yanagizawa, atriz e diretora carioca, uma das fundadoras da Cia Teatro Autônomo, que há anos vem pesquisando sobre uma possível atuação naturalista no teatro.

 

Para Luiz Fernando Marques, a ideia de ORGIA OU DE COMO OS CORPOS PODEM SUBSTITUIR AS IDEIASbaseia-se na continuidade e aprofundamento da pesquisa do coletivo, criado em 2010 para refletir as questões de gênero, tendo a arena cênica como plataforma. “Interatividade, espaço não convencional e construção de dramaturgia própria são os pilares da pesquisa”, diz ele.

 

Recife e Buenos Aires

As derivas erótico-sociológicas de Túlio Carella pelas ruas da Recife dos anos 60 e a sua coragem em registrar num diário suas experiências fizeram o Teatro Kunyn refletir sobre como o corpo pode ser político, de como pode substituir as ideias e ser ele mesmo com seu contorno, fluidos e tessituras, uma fundação de nova ordem mundial, onde o encontro com o diferente se dá sem meio termo, sem concessões, sem volta.

 

Em 2011, ao ser contemplado com o Prêmio de Teatro Myriam Muniz para a circulação da peça Dizer e não Pedir Segredo, uma das cidades escolhidas pelo Teatro Kunyn foi propositadamente o Recife. Na ocasião o grupo deu início às pesquisas sobre Túlio Carella, visitando os locais onde ele andou e morou e que descreve nos livros, além de realizar alguns procedimentos artísticos sobre a ideia de deriva.

 

Os três atores e o diretor da montagem também realizaram outra viagem e passaram a primeira semana de 2015 em Buenos Aires, capital da Argentina. Lá eles puderam pesquisar mais sobre Tulio Carella e também já garimparam várias peças e objetos que serão usadas como figurino e parte da cenografia.

 

“Cada cidade carrega em si uma espécie de cartografia não oficial, esse mapa que não está impresso, mas que se desenha no imaginário coletivo daqueles que precisam viver seus desejos à margem, pelas bordas, pelas frestas, pelas possibilidades de rasgos, nas pernas, mãos e pés que caminham com códigos próprios, e entram e saem dos inferninhos encravados no centro da cidade pulsante. Essa deriva, essa andança pela cidade pretende ser traduzida em jogo cênico, colocando em fricção a Recife dos anos 60 com São Paulo de hoje, o Brasil em plena ditadura com o Brasil pós-PT”, conta o ator Ronaldo Serruya.

 

 

Para roteiro:

 

ORGIA OU DE COMO OS CORPOS PODEM SUBSTITUIR AS IDEIAS – Estreia dia 10 de julho, sexta-feira, às 15 horas, no Parque Trianon. Com Teatro Kunyn. Direção – Luiz Fernando Marques. Atuação – Ronaldo Serruya, Paulo Arcuri e Luiz Gustavo Jahjah. Dramaturgia Primeiro e Segundo Ato – Teatro Kunyn. Dramaturgia Terceiro Ato – Alexandre Dal Farra. Direção de Arte – Yumi Sakate. Desenho de Luz – Wagner Antônio. Elenco Deriva – Affonso Lobo, Eduardo Fonseca, Fernando Delabio, Filipe Ramos, Gabriel Castro, Ítalo Martins, Kako Arancabia, Marcelo Zorzeto, Thiago Felix e Thiago Moreira. Preparação de Ator Primeiro Ato – Miwa Yanagizawa. Preparação de Ator Segundo Ato – Edgard Castro. Produção – Fernando Gimenes. Duração – 120 minutos. Temporada – Sexta-feira a domingo às 15 horas. Recomendado para maiores de 18 anos. GRÁTIS.Até 16 de agosto.

 

PARQUE TRIANON – Entrada pela Rua Peixoto Gomide (próximo a estação Trianon/MASP do metrô). Informações e reservas – (11) 94151-3055. Capacidade – 21 pessoas. É necessário fazer reserva por telefone.

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