Cultura - Teatro

Abnegação, do grupo Tablado de Arruar volta em cartaz na Oswald de Andrade

16 de Setembro de 2014

 

O mais recente texto de Alexandre Dal Farra estreou em fevereiro no Centro Cultural São Paulo e chamou a atenção ao abordar as relações de poder nos bastidores da política. Indicado ao Prêmio APCA de melhor autor, o grupo Tablado de Arruar volta em nova temporada de Abnegação de 18 de setembro a 11 de outubro, na Oficina Cultural Oswald de Andrade. Os ingressos são gratuitos e devem ser retirados com uma hora de antecedência no dia da apresentação.

Uma reunião restrita em uma casa de campo sobre um assunto com dimensões nacionais. Quatro homens e uma mulher precisam tomar uma decisão que pode gerar consequências catastróficas. Dando sequência à pesquisa iniciada em Mateus, 10 (prêmio Shell de Melhor Autor para Alexandre Dal Farra), a encenação minimalista dirigida por Dal Farra e Clayton Mariano dispensa efeitos e usa a força dos diálogos para inserir o espectador na trama. No elenco, André Capuano, Alexandra Tavares, Carlos Morelli, Vinicius Meloni e Vitor Vieira.

Valendo-se de uma linguagem afiada e do gosto por assuntos polêmicos, o espetáculo mostra cinco personagens ligadas à estrutura do poder, diante de uma situação onde cada decisão poderá gerar consequências trágicas. O que não se diz parece revelar mais do que aquilo que se fala abertamente. 

Em uma atmosfera repleta de intrigas, traições e armadilhas, a trama acontece ao fim de uma festa. Durante uma reunião, na calada da noite, os integrantes de um partido político discutem o que se pode fazer em relação a um acontecimento do passado que vem à tona. São quatro da manhã, em um local afastado, uma fazenda de um dos militantes do partido.

Ao longo da madrugada, em meio a muitas garrafas de bebida alcoólica, os envolvidos discutem, se desesperam, bebem, dançam e brigam ao som do hit sertanejo Vem Ni Mim, Dodge Ram, do cantor de arrocha Israel Novais, enquanto o dia amanhece e eles decidem o que fazer frente ao problema que os aflige. Depois da decisão tomada, no segundo ato, feito de cenas menores, vemos as consequências da decisão tomada anteriormente para a vida de cada uma das figuras envolvidas.

"Mais importante do que os fatos que constituem a trama é a maneira como eles ocorrem. As personagens se encontram em situações-limite e importa mais ver como agem e como se relacionam do que entender as suas histórias pessoais e a narrativa como um todo”, diz Alexandre Dal Farra.

A direção privilegia o texto e a interpretação. Mais importante do que contar uma história é ver como as personagens lidam com aquela situação. “Nosso foco está no ator e na dramaturgia. Isso já é uma marca do nosso trabalho. Durante os ensaios trabalhamos muito com a improvisação, com o jogo em cena e com a concepção de cada personagem. Trazemos o texto e uma ideia geral das características que cada uma daquelas personagens carregam. E assim, vamos criando a atmosfera, o ambiente, a sensação de que alguma coisa está acontecendo, dos conchavos e complôs tão característicos do jogo político”, explica Clayton Mariano. 

O artista plástico Eduardo Climachauska assina a direção de arte que trabalha com elementos conceituais. O espaço cênico, todo aparente, vai se transformando à medida que as cenas vão acontecendo. No primeiro ato, dois tablados de madeira remetem a um salão de festas. Em cima deles, uma mesa redonda com toalha vermelha, alguns copos e garrafas de bebidas compõem o ambiente com quatro cadeiras.

Cada tablado possui um sistema mecânico, com roldanas aparentes, que permitem a movimentação dos atores, separando o espaço em duas partes. No segundo ato, um sofá com mesa de centro e cadeira representa a casa de alguns personagens. Ao final, a ação se passa num restaurante japonês com tatame, mesa baixa e parede em papel de arroz.

O texto dá continuidade a uma pesquisa de linguagem consolidada pelo grupo com a peça Mateus, 10. O ponto de partida é um acontecimento real, mas que, no entanto, não se prende às normas do realismo.  As personagens estão livres em cena para lidar com a situação em que estão inseridas. Para o autor, “não se trata de um processo de improvisação cênica, mas um ponto de partida para a criação de um texto, escrito previamente”.

A ideia surgiu do interesse de Dal Farra pela situação atual do Partido dos Trabalhadores e pela estrutura de relações que ocorrem em um partido tido como de esquerda, porém ligado às mais altas esferas de poder. “Creio que esse lugar singular que o PT ocupa gera um tipo de contradição que influi nos seus integrantes de forma interessante. Embora sejam pessoas profundamente abnegadas, com um passado de militância política, agora estão envolvidos em jogos de poder que contradizem aquilo que inicialmente buscavam. Isso gera uma certa maneira de se relacionar com o poder, a meu ver bastante particular.”

 

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