Mais uma vez, a Defensoria Pública de SP precisou ir até os Tribunais Superiores, em Brasília (DF), para garantir a aplicação do princípio da insignificância, negada anteriormente pelo Juízo de primeira instância e pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP), e, assim, obter a absolvição de um réu preso e condenado por tentativa de furto de alimentos.
Neste caso, ocorrido em Santos, um homem foi preso sob a acusação de tentar furtar de um mercado 3 pacotes de batatas fritas, cujo valor estimado soma R$ 54,00. A Defensoria pleiteou a absolvição sumária do acusado em razão da atipicidade da conduta, por força do princípio da insignificância. O Juízo, porém, negou o requerimento sob o argumento de o homem ser reincidente, o que, de acordo com o julgador, configura impeditivo para o reconhecimento do crime de bagatela. Assim, a Defensoria impetrou habeas corpus ao TJ-SP, também indeferido pela 1ª Câmara de Direito Criminal da Corte paulista. A Defesa, então, impetrou novo habeas corpus, desta vez ao Superior Tribunal de Justiça.
“Em determinados casos, o ataque ao bem jurídico é tão irrelevante que a intervenção penal se torna desproporcional, já que implicaria restrição a direitos fundamentais sem autorização constitucional. Como cediço, a aplicação do princípio da insignificância requer o exame das circunstâncias do fato criminoso. A verificação da lesividade mínima da conduta, apta a torná-la atípica, deve levar em consideração a importância do objeto material subtraído, a condição econômica do sujeito passivo, assim como as circunstâncias e o resultado do crime, a fim de se determinar, normativamente, se houve ou não relevante lesão ao bem jurídico tutelado”, sustentou o Defensor Público Volney Santos Teixeira. “Diante disso, evidenciada a ínfima lesividade da conduta, infere-se hipótese de aplicabilidade do princípio da insignificância, afastando-se a tipicidade material”, requereu.
Na decisão, a Relatora, Ministra Laurita Vaz, acolheu os argumentos da Defensoria. “Na hipótese dos autos, tendo em vista as peculiaridades do caso, constato o desinteresse estatal à repressão da conduta praticada pelo paciente”, pontuou a Magistrada. “A despeito de o paciente ser reincidente e portador de maus antecedentes, a natureza dos bens subtraídos (gênero alimentício), seu reduzido valor, bem como a circunstância de ser a vítima um estabelecimento comercial (com capacidade financeira mais expressiva) autorizam a conclusão de que o grau de reprovabilidade da conduta do paciente é mínimo, não tendo havido dano social relevante”, complementou, aplicando o princípio da insignificância para reconhecer a atipicidade material da conduta e trancar a ação penal.
Princípio da insignificância
A Defensoria Pública de SP obteve recentemente, nos Tribunais Superiores, decisões favoráveis a réus acusados de tentativas de furto de itens de pequeno valor contra estabelecimentos comerciais.
Embora esteja sedimentada desde 2004 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a incidência do “princípio da insignificância” nem sempre é aplicada em instâncias iniciais e termina sendo reconhecida apenas após recursos a Cortes Superiores. Há casos de réus que respondem presos a essas acusações.
Reconhecido pela jurisprudência e doutrina penal, o princípio da insignificância tem o intuito de afastar a tipicidade penal, isto é, afastar a criminalização, em casos de furto ou tentativa de furto que preencham alguns requisitos, como a mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
O objetivo é evitar que condutas de baixo potencial ofensivo sofram os rigores da intervenção penal, que deve ser reservada apenas a condutas que impliquem grave ofensa social.