A Defensoria Pública de SP precisou ir até o Supremo Tribunal Federal (STF) para obter a aplicação do princípio da insignificância e consequente absolvição de um homem condenado por tentativa de furto de dois sacos de lixo reciclável avaliados em aproximadamente R$ 30. O caso ocorreu no município de Ibaté.
No interrogatório policial, o homem afirmou ter tentado furtar o material de uma cooperativa de reciclagem para vendê-los e, com o dinheiro obtido, comprar comida. Mesmo diante da manifestação da defesa em duas oportunidades, durante o plantão judicial do final de semana, sua prisão foi mantida.
Foram impetrados habeas corpus perante o Tribunal de Justiça de SP (TJ-SP) e, posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça, ambos negados. Assim, o Defensor Público Pedro Naves Magalhães, que atua na unidade da Defensoria em São Carlos, levou o pedido de habeas corpus ao STF.
“O suposto furto tentado não causou nenhum prejuízo à vítima, já que os objetos lhe foram integralmente restituídos. No mais, o comportamento atribuído ao paciente não se revestiu de reprovabilidade tal que justificasse a imposição de sanção penal nem revela periculosidade significativa”, sustentou o Defensor.
“Ainda que se considere moralmente reprovável a conduta delitiva ora apurada, as circunstâncias indicam que não se reveste de relevância para o direito penal, sendo profundamente desproporcional a mobilização da máquina judiciária. Dessa forma, justifica-se o trancamento do processo, no presente caso, uma vez que embora formalmente típica, a conduta imputada ao paciente não se reveste de qualquer tipicidade material, necessária para permitir a continuidade do processo”, acrescentou, pleiteando a aplicação do princípio da insignificância.
Na decisão, a Ministra Carmen Lúcia concedeu ordem para reconhecer a insignificância da conduta, revogar a prisão preventiva e absolver o réu. “Considerando a perspectiva do paciente, verifica-se estar a pessoa em situação de rua, em inquestionável vulnerabilidade econômica e social, sendo reduzido o grau de reprovabilidade da conduta”, observou a Ministra. “Considerando-se as circunstâncias do caso, evidenciada a insignificância penal dos efeitos antijurídicos do ato tido por delituoso, afigura-se desproporcional a imposição de sanção penal e mais ainda a decretação da prisão preventiva, em pleno período de pandemia do novo coronavírus”, avaliou.
Princípio da insignificância
A Defensoria Pública de SP obteve recentemente nos Tribunais Superiores decisões favoráveis a réus acusados de tentativas de furto de itens de pequeno valor contra estabelecimentos comerciais.
Embora esteja sedimentada desde 2004 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a incidência do “princípio da insignificância” nem sempre é aplicada em instâncias iniciais e termina sendo reconhecida apenas após recursos a Cortes Superiores. Há casos de réus que respondem presos a essas acusações.
Reconhecido pela jurisprudência e doutrina penal, o princípio da insignificância tem o intuito de afastar a tipicidade penal, isto é, afastar a criminalização, em casos de furto ou tentativa de furto que preencha alguns requisitos, como a mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
O objetivo é evitar que condutas de baixo potencial ofensivo sofram os rigores da intervenção penal, que deve ser reservada apenas a condutas que impliquem grave ofensa social.
Veja outros casos recentes que foi preciso recorrer aos Tribunais Superiores para fazer valer a aplicação do princípio da insignificância: