Cultura - Teatro

Teatro Unimed abre as portas em São Paulo com musical Lazarus, de David Bowie

22 de Agosto de 2019

A cena artística paulistana ganha no início do segundo semestre um novo palco. Iniciativa do empresário Fernando Tchalian, o Teatro Unimed surge com a promessa de se tornar um espaço de excelência para a cultura na cidade. Localizado em um dos pontos mais centrais de São Paulo, na esquina da Rua Augusta com a Alameda Santos, a apenas uma quadra da Avenida Paulista, o projeto arquitetônico traz a assinatura do arquiteto Isay Weinfeld. Os produtores Monique Gardenberg e Jeffrey Neale respondem pela curadoria da programação, que abre no dia 22 de agosto com o musical Lazarus, de David Bowie, dirigido por Felipe Hirsch.

Todo revestido em madeira, com 246 lugares distribuídos entre plateias inferior e superior, palco de 100 metros quadrados, boca de cena com 12 metros de largura e um pequeno fosso para acomodar músicos, o teatro, o primeiro a sair da prancheta de Isay, ocupa o primeiro andar do sofisticado edifício projetado pelo arquiteto, o Santos Augusta, empreendimento da Desenvolvedora REUD que reúne escritórios, o café Perseu e o restaurante Casimiro.

Está ainda prevista no local a inauguração, até o fim do ano, de um pequeno take away café no lado voltado para a Rua Augusta - projeto de Paulo Mendes da Rocha, único brasileiro, além de Oscar Niemeyer, a ter vencido o Prêmio Pritzker, o Oscar da Arquitetura.

“Trabalhar na construção e viabilização de lugares que possam se tornar parte da história de São Paulo é o que me faz seguir em frente. É a materialização do conceito de que quando se acrescenta significado a um espaço, ele se transforma em um lugar”, define Tchalian, CEO da REUD.

A aquisição pela Unimed do naming rights (o direito de dar nome ao estabelecimento) vai garantir financeiramente a diversidade e qualidade das atrações do espaço nos próximos anos e faz parte da estratégia de reposicionamento da seguradora no mercado brasileiro.

Alexandre Ruschi, presidente da Central Nacional Unimed explica que ser referência em saúde na capital paulista é umas das grandes premissas da cooperativa nacional em 2019. “O Sistema Unimed trabalha um novo posicionamento da marca em São Paulo, com parcerias estratégicas, aperfeiçoamento no atendimento e investimento em projetos que reforcem o compromisso com a essência, valores e missão para os clientes. O teatro é mais uma conquista para a marca, visando fortalecer a imagem de todas as cooperativas, incentivando e proporcionando grandes oportunidades e experiências de cultura e lazer a todos os tipos de público”.

A escolha de Lazarus para estrear o espaço partiu de Jeffrey Neale, sócio de Monique Gardenberg na Dueto Produções, empresa responsável por grandes eventos culturais, como o Free Jazz, o Tim Festival, BMW Jazz Fest e, atualmente, a exposição sobre Björk em cartaz no MIS - Museu da Imagem e do Som paulista.

Escrito por David Bowie e o dramaturgo irlandês Enda Walsh, Lazarus é baseado no romance “O homem que caiu na terra”, que na versão para o cinema teve o cantor e compositor inglês no papel de protagonista. O roteiro narra a vida atormentada de Thomas Newton, um alienígena que viaja para a terra para salvar seu planeta. O espetáculo estreou oficialmente em Nova York em dezembro de 2015, com a presença de Bowie, um mês antes de sua morte.

Grande conhecedor da obra de Bowie, Felipe Hirsch encena pela primeira vez um musical. Para chegar ao elenco final (Bruna Guerin, Carla Salle, Jesuíta Barbosa, Rafael Losso, Gabriel Stauffer, Luci Salutes, Marcos de Andrade, Natasha Jascalevich, Olivia Torres, Valentina Herszage e Vitor Vieira), ele testou, junto com as diretoras musicais Maria Beraldo e Mariá Portugal, mais de duas centenas de atores selecionados pela produtora de elenco Marcela Altberg.

Lazarus apresenta 18 músicas de diversas fases da carreira de Bowie. Grandes sucessos como Life on Mars e Heroes estão na lista, que também inclui músicas do último álbum de Bowie, Blackstar.

Daniela Thomas e Felipe Tassara assinam a direção de arte; Veronica Julian e Diogo Costa, os figurinos; e Alejandro Ahmed, a direção de movimento.

LAZARUS: MODO DE USAR

Por Dodô Azevedo

Antes de tudo, cinco instruções para melhor aproveitar Lazarus, o espetáculo que você está prestes a assistir.

1. Estar vivo. Não vivo, respirando, porque a maioria das pessoas que respiram não estão realmente vivas. Não estão interessadas em aprofundar-se em nada. Interessadas apenas no que pode vir até elas. No que não as dê trabalho de ir até elas. A maioria das pessoas que respiram neste admirável novo mundo do on demand não estão vivas. Estão apenas existindo.

2. Tentar lembrar-se da última vez em que foi calculado o seu peso.

3. Caso você use óculos de grau, os retire. Caso você não use, peça para quem use um emprestado.

4. Reflita sobre qualquer coisa.

5. Entenda que você está prestes a ter um encontro com atores, atrizes e músicos que irão morrer. Entender que todo o elenco de Lazarus, por mais jovem que seja, irá morrer. Não hoje. Mas certamente algum dia. É preciso que você entenda que a brevidade deste encontro o torna especial. Em cinema, você pode comprar um DVD e para sempre ver e rever os atores que quiser. Em Teatro, não. 

Na vida, também não. David Bowie parou de respirar e existir em janeiro de 2016. Mas não parou de viver. Porque entendeu, cedo, que a vida, a existência, é breve. Um entrar e sair de cena. Que é preciso estar no mundo como se ele fosse um palco. Por isso foi, deliberadamente, é deliberadamente o mais teatral dos artistas vivos. Hoje. 

A vida é essa tragédia: como um espetáculo em um palco, uma hora acaba.

Sendo o primeiro artista que entendeu a dimensão pop da tragédia de nossa condição existencial, David Bowie tratou de escrever e dirigir sua própria vida. Antes de, como a maioria de nós, tornar-se o que o mundo quisesse que ele se tornasse, foi ser o que ele decidiu ser. 

Você, então, ao sentar na poltrona, é ao mesmo tempo espectador do espetáculo Lazarus e figurante no espetáculo "A vida de David Bowie". No espetáculo "A vida de David Bowie", que continuou vivo mesmo finda sua existência, há uma cena em que ele escreve um musical e várias pessoas vão assistir. Uma delas, você. 

O jovem elenco no palco de Lazarus, também acabam sendo atores neste grande espetáculo chamado "A vida de David Bowie". E também são atores os 110 profissionais envolvidos na montagem brasileira deste musical. 110 empregos gerados; gente abençoada que trabalhou muito para este breve encontro que terá com você no teatro. Meses de dedicação, amor pelo ofício que, no caso da arte, é amor pelo outro, amor por todos, interesse por todas as pessoas no planeta.

Atrás do palco do espetáculo você não pode ver (tanto do palco como "no palco da vida"). Mas, se pudesse, você veria as quase duas toneladas de equipamento,  700 kg de luz, 300 kg de áudio, 600 kg de projeção, 300 kg de cenário. A conta do peso desse encontro que você está prestes a ter. 

De um espetáculo que fala do peso da vida. Lazarus conta a história de um alienígena que migra para o planeta terra porque seu lar, cujo nome é Anthea, já não é mais habitável. Corre para a Terra na esperança de refazer a vida e trazer seu povo para cá. Não demora e começa a sentir o peso de viver aqui. Um estranho em terra estranha. Frustrado, torna-se um alcoólatra rodeado de fantasmas e memórias. 

Há o que chamamos de memória proustiana, aquela que na obra Em busca do Tempo Perdido, é despertada pelo gosto das madeleines. São memórias tão profundas que não conseguimos domá-las. Elas aparecem quando querem. E quando aparecem, não conseguimos contá-la com palavras. Quando nossas memórias mais profundas aparecem, apenas a arte dá conta.

Se você perguntar a Felipe Hirsch, diretor de Lazarus, como ele se sentiu, aos 17 anos, ao ver ao vivo David Bowie no palco do antigo estádio do Palmeiras, em São Paulo, ele passará vinte minutos contando como foi a viagem de Curitiba, dar detalhes de como se comportava a plateia, os momentos preferidos do show. Mas o momento em que viu Bowie pela primeira vez, isso as palavras não alcançam.

Uma coisa é certa: Bowie foi fundamental para a calibragem do peso da vida para Felipe. Lazarus é todo sobre gravidade, reflexão e desfoque. Os diretores de arte Daniela Thomas e Felipe Tassara, seus há tempos parceiros de madeleines, conceberam, reencontrando as ideias do revolucionário cenógrafo tcheco Josef Svoboda, um cenário onde o ônus e o bônus da gravidade, do ver-se refletido em uma superfície e do perceber o mundo como algo desfocado será testado de modo radical e nunca visto antes. 

Se você perguntar a Daniela Thomas algo sobre este processo, ela irá dizer que, logo no início da concepção da montagem brasileira de Lazarus, decidiu que queria "uma peça desfocada". O peso da vida nos torna desfocados a ela. O reflexo de nós mesmos é insuportável. Para Thomas Newton, o personagem alienígena imigrante que vê sua esperança transformar-se em desespero, seu reflexo é insuportável. É preciso tomar um trago para aguentar o tranco. É preciso beber até tornar o mundo desfocado. 

E enfrentar seus fantasmas. Para o personagem principal de Lazarus, escrito por Bowie, mas baseado no livro O Homem que Caiu na Terra, de Walter Tevis, isso significa visitas do fantasma de uma jovem que não sabemos quem é (nem ela própria, quem nunca?) que irá dizer frases que podem salvar ou aniquilar uma vida; como "Você não precisa falar, você precisa ouvir", ou "Quando se está preso entre dois mundos, faz todo sentido tentar algo diferente". 

A geração de Felipe Hirsch viu muitos amigos cometerem o suicídio cedo. No auge da juventude. Felipe perdeu alguns. O peso da vida. Quando despontou no Teatro Brasileiro, Felipe era descrito como enfant terrible. Seu Avenida Dropsie é de uma ousadia conceitual (produzir uma peça de teatro baseada em uma história em quadrinhos) nunca repetida por ninguém. Hoje, como um alienígena com saudades de Anthea, seu planeta natal, Felipe vive o luto pela juventude perdida. Um lugar para onde não dá mais para voltar. Um imigrante definitivo. Lazarus é dedicado a seus amigos de juventude. Mas, ao mesmo tempo, comemora o fato de "enfant" não mais caber em sua descrição. "Eu era sentimental quando eu era velho", fala um Batman com cabelos brancos em uma Graphic Novel de Frank Miller. 

Todo mundo tem um lugar para onde não se pode mais voltar - esse é o segredo da universalidade de Lazarus.

Temos, então, um diretor interessado pela questão migratória, em um mundo que passa por uma crise de diásporas, em um país cujo útero foi o Cais do Valongo, maior porto escravocrata da história de toda a humanidade, dirigindo um musical escrito por um artista interessado pela questão migratória, que por sua vez deu o título do espetáculo em homenagem a Emma Lazarus, poetisa norte-americana do século 19, que por sua vez vem a ser a autora do poema que fala sobre migração, cravado em bronze na Estátua da Liberdade em Nova York, e inspirado em um livro que fala sobre um expatriado deprimido por sua terra natal.

Anthea, Ítaca, Pasárgada, Ilê, Maracangalha. Todo mundo tem a sua. O Homem que Caiu na Terra foi publicado durante a Guerra Fria. Em um mundo polarizado entre direita e esquerda, conservadores e liberais, certo e errado, a percepção binária do mundo. Um mundo que rejeita tudo o que é estranho. Um mundo praticamente idêntico ao contemporâneo.

Em Lazarus, tudo é estranho. O texto é cifrado, há referências que só se percebe se você for interessado o suficiente para aprofundar-se no(s) universo(s) de David(s) Bowie(s). Se você estiver de fato vivo. A encenação do espetáculo o tempo todo nos convida a tentar ver beleza em descompassos de tempo. Atores e atrizes estão em lugares e funções nunca antes experimentados por eles. Jesuíta Barbosa estreia nos palcos de um musical. Carla Salle passou os ensaios concentrada e olhado para o chão como uma pugilista no corner de um ringue, Bruna Guerin, a experiente em musicais, não disfarça alegria de desafiar-se. Nos arranjos das canções de Bowie para esse espetáculo, até Ornette Coleman e seu Free Jazz são evocados.

Se você perguntar à Maria Beraldo e Mariá Portugal, dupla exemplarmente jovem, já chamada pela imprensa paulistana de "integrantes da Nova Lira Paulistana", sobre como é o peso de estrear como diretoras musicais de um espetáculo com músicas de David Bowie (5 delas escritas exclusivamente para o musical), elas dirão da leveza de se trabalhar com um artista que manipulou o sistema, ante de ser manipulado por ele. Tão interessadas no outro que ambas são, aqui em seus trabalhos autorais, se você elogiar suas performances ao vivo, elas dirão que "toca bem quem escuta bem". 

Esse exercício de escuta que afinal orientou toda a equipe de Lazarus é o que você deve fazer antes do espetáculo começar. Antes desse breve e eterno momento. Escutar o outro, escutar a si, escutar seus fantasmas. Um exercício que também é perigoso, como Bowie é perigoso, pesado e estranho, na medida de que a vida precisa de certa beleza e peso e estranhamento para ser interessante. 

Se você perguntar a Alejandro Ahmed, diretor de movimento do musical, como se deu o processo de orientação do elenco, ele irá responder que o mais importante a um ator é disponibilizar-se ao risco ao exercício crítico constante do movimento. 

Ou seja, todos na equipe de Lazarus são como o próprio Bowie: com palavras, respondem o que querem. Mas o que foi perguntado, eles respondem é com arte. E não se explicam. Afinal o próprio Bowie é, e tem que ser, inexplicável. Tem que ser, para fazer ressuscitar em nós, essa Anthea perdida que é a crença na potência de nossa intuição. Esse Lázaro enterrado sob o peso da vida, a gravidade da brevidade dos encontros, o reflexo de tudo se resumir a entrar e sair de cena. Tudo se resume ao que você fará com o tempo lhe dado no palco. 

O peso, a brevidade e os reflexos. A cena e os encontros. A gravidade, a vida e o palco. O palco e o peso. O peso e cena. O reflexo e o encontro. Agora estão todos prontos.

O espetáculo vai começar. 

FICHA TÉCNICA

LAZARUS, de David Bowie e Enda Walsh

Direção geral: Felipe Hirsch

Direção musical: Maria Beraldo e Mariá Portugal

Direção de arte: Daniela Thomas e Felipe Tassara
Figurino: Veronica Julian e Diogo Costa

Direção de movimento: Alejandro Ahmed

Iluminação: Beto Bruel

Elenco: Bruna Guerin, Carla Salle, Jesuíta Barbosa, Rafael Losso, Gabriel Stauffer, Luci Salutes, Marcos de Andrade, Natasha Jascalevich, Olivia Torres, Valentina Herszage e Vitor Vieira

Músicos: Fabio Sá, Maria Beraldo, Mariá Portugal

Casting: Marcela Altberg

Produção: Bruno Girello e Ricardo Frayha

Realização: Dueto Produções

SERVIÇO

TEATRO UNIMED (www.teatrounimed.com.br)

Endereço: Edifício Santos Augusta - Alameda Santos, 2159/1O andar - Cerqueira César

Pré-estreia: 22 de agosto

Temporada: 23 de agosto a 27 de outubro de 2019
Horários

Quinta a sábado, às 21h

Domingo, às 18h

Preço

Quinta-feira:  Plateia - R$ 120,00 / Balcão - R$ 80,00

Sexta e sábado: Plateia - R$ 180,00 / Balcão - R$ 120,00

Domingo: Plateia - R$ 180,00 / Balcão - R$ 120,00

Compra pela internet: www.eventim.com.br
Informações: atendimento@eventim.com.br

Ponto de venda Eventim sem cobrança de taxa de conveniência:

Allianz Parque - Rua Palestra Itália, 214 (terça a domingo, de 10h às 17h). Em dias de jogos e eventos, o horário de atendimento está sugestão a alteração. Não funciona nos feriados.

Bilheteria do Teatro Unimed (a partir de 15/08):  
Horário da atendimento: Quintas, sextas e sábados, de 13h às 21h.

Domingos, de 12h às 18h

Estacionamento no local: R$ 25,00 (preço único todos os dias após 18h)

Capacidade do teatro – 246 pessoas

Classificação etária: 16 anos

Duração: 120 minutos

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