Colunistas - Rodolfo Bonventti

Sérgio Cardoso era escravo e presidente, ao mesmo tempo, em A Cabana do Pai Tomás

13 de Março de 2013


O sucesso de "Antonio Maria" na TV Tupi chamou a atenção dos diretores de telenovelas das outras emissoras para o nome de Sérgio Cardoso, um dos mais renomados atores do nosso teatro, e que escreveria também o seu nome na teledramaturgia nacional a partir da novela de Geraldo Vietri.

Em 1969, a TV Globo resolveu investir em mais uma novela de época e encomendou para Hedy Maia a adaptação para a TV de "A Cabana do Pai Tomás", uma historia do movimento abolicionista nos Estados Unidos da América, baseada no livro de Harriet Stowe, já explorada pelo cinema americano.

Com o patrocínio da Colgate-Palmolive, a Globo construiu um estúdio na sua emissora de São Paulo especialmente para a gravação da novela e as cenas externas foram realizadas durante uma colheita de algodão em uma fazenda de Campinas. E na hora da escolha de quem interpretaria o escravo Tomás, a patrocinadora exigiu que o papel fosse dado a Sérgio Cardoso, naquele momento o ator mais comentado e aplaudido em terras paulistanas.

A Globo concordou e o ator foi devidamente contratado, mas como dar a um ator branco um personagem negro? A saída encontrada pelos diretores Fábio Sabag, Daniel Filho e Régis Cardoso com a sua equipe foi utilizar a técnica do blackface, já várias vezes usada pelo cinema norte-americano, que consistia em pintar o rosto e o corpo do ator de preto e ainda confeccionar uma peruca para alterar também o cabelo do ator.



Mas a novela parecia fadada a ter um percurso cheio de percalços na emissora. Um incêndio nas instalações da TV Globo na capital paulista, apenas um dia após a estreia da novela, que foi em 07 de julho de 1969, acabou com os cenários e tudo teve que ser adaptado rapidamente em um estúdio no Rio de Janeiro, o que atrapalhou as gravações e limitou os recursos destinados à produção da novela.

Já em São Paulo, a estreia da novela com Sérgio Cardoso ocupando o lugar que deveria ser de um ator negro provocou uma série de protestos que ganharam as páginas dos jornais paulistas rapidamente, e os comentários e protestos também se estenderam para algumas rádios e programas de outras emissoras. Um dos mais indignados era o teatrólogo, ator, diretor e colunista Plinio Marcos. Para amenizar as críticas, Sérgio Cardoso ganhou dois papéis de branco na mesma novela, e foi ao mesmo tempo o escravo Pai Tomás, o presidente norte-americano Abraham Lincoln e o defensor da causa dos negros, Dimitrius. Um exercício e tanto para o ator.

Com Ruth de Souza vivendo a Tia Cloé, esposa do Pai Tomás, em um brilhante desempenho, e um elenco composto por nomes expressivos como Miriam Mehler, Edney Giovenazzi, Maria Luiza Castelli, Felipe Carone, Eloisa Mafalda, Haroldo de Oliveira, Isaura Bruno, Jacyra Silva, Érico Freitas, Jorge Coutinho, Germano Filho, Ivete Bonfá, Paulo Goulart e Norah Fontes, entre outros, a novela não conseguiu conquistar o público, nem mesmo com as polêmicas criadas na imprensa paulista, e acabou se tornando uma empreitada com baixa audiência em São Paulo, justamente a praça que a Globo queria conquistar com a novela, bem como no Rio de Janeiro, onde outras produções da emissora tinham levantado bons índices no Ibope, anteriormente.

E na próxima semana: Raul Longras, o casamenteiro da TV.
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