“Comemorado em 14 de abril, o Dia Nacional de Luta pela Educação Inclusiva reforça a importância de garantir o direito ao ensino para todos”, defende Rafael Cavichiolli, professor surdo da Faculdade SESI de Educação
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Rafael Cavichiolli Teixeira, professor de Libras. | Foto: Arquivo |
O Dia Nacional de Luta pela Educação Inclusiva, celebrado em 14 de abril, reforça a importância de garantir o acesso à aprendizagem para todos os estudantes. No Brasil, a educação inclusiva tem avançado, e o ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras) por professores surdos desempenha um papel fundamental nesse processo. Mais do que ensinar a estrutura da língua, esses profissionais compartilham a cultura e a identidade da comunidade surda, proporcionando uma formação mais completa, voltada para a diversidade.
Na Faculdade SESI de Educação, todos os estudantes das cinco áreas de conhecimento - Linguagem, Matemática, Ciências Humanas, Ciências da Natureza e Educação Física - têm a oportunidade de aprender Libras com Rafael Cavichiolli, professor surdo, graduado em Letras Libras pela Universidade Federal de Santa Catarina, especialista em Docência da Libras pela UNÍNTESE, licenciado em Pedagogia pela Uniasselvi, mestre e doutorando em Linguística e Língua Portuguesa pela Universidade Estadual Paulista (UNESP).
“Professores surdos são fundamentais porque ensinam Libras como língua natural, transmitindo não apenas os sinais, mas também a cultura e a identidade surda. Além disso, servem como modelo de referência para alunos surdos e demonstram que a comunidade surda pode ocupar espaços de ensino e protagonizar sua própria educação”, comenta.
Segundo Rafael, a fluência em Libras possibilita que professores interajam diretamente com alunos surdos, reduzindo a dependência de intérpretes e tornando o ambiente educacional mais acessível. Isso também incentiva a participação dos estudantes surdos no ensino regular e fortalece a interação entre colegas ouvintes e surdos.
Contudo, o aprendizado da Libras apresenta desafios para alunos ouvintes, principalmente por sua estrutura gramatical distinta do português. Rafael diz que a adaptação à modalidade visuoespacial da língua também é um obstáculo a ser superado, já que muitos estão habituados à comunicação oral-auditiva. Para minimizar essas dificuldades, ele incentiva a imersão na comunidade surda, promove exercícios práticos e utiliza recursos audiovisuais.
Além disso, Rafael destaca o papel da Faculdade SESI de Educação na promoção de uma cultura inclusiva e de respeito às diferenças. “Na Faculdade SESI, os professores aprendem comigo - um professor surdo. As interações nas aulas ajudam a construir uma nova perspectiva sobre a inclusão de alunos surdos. A presença do intérprete garante o direito à comunicação para todos. Também desenvolvemos projetos de pesquisa e grupos de estudo voltados à Educação Bilíngue e à formação em Libras, o que contribui para transformar a prática pedagógica e fortalecer o compromisso com a educação inclusiva”.
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Foto: Arquivo |
De acordo com o Censo Escolar 2023, o Brasil possui cerca de 62 mil estudantes surdos, com deficiência auditiva ou surdocegos matriculados na educação básica. Desse total, 55 mil, em média, estão em classes comuns e 6 mil em classes ou escolas bilíngues de surdos. No ensino superior, o número de estudantes surdos ainda é reduzido: são quase 5 mil matrículas, e apenas 1.397 alunos já concluíram seus cursos. O país também conta com 269 mestres, 97 doutores e 13 pós-doutores surdos, evidenciando a necessidade de políticas educacionais mais eficazes para garantir acesso à educação superior.
Apesar dos avanços com a maior presença da Libras nas escolas e universidades e a ampliação de materiais didáticos, o professor explica que ainda há desafios. “No Brasil, poucas instituições oferecem creches bilíngues, sendo o Centro de Educação para Surdos Rio Branco (CES) uma das exceções, com seu Programa de Estimulação do Desenvolvimento (PED). O projeto proporciona contato lúdico entre crianças e adultos surdos, promovendo a aquisição natural da Libras desde os primeiros anos de vida”.
No ensino superior, o papel do professor surdo também vai além da transmissão da língua. Rafael destaca que também ensina sobre a identidade surda, a história da comunidade no Brasil e a importância da acessibilidade. “É essencial abordar as diferentes variações regionais da Libras, as lutas pelos direitos dos surdos e como evitar atitudes capacitistas”, afirma.
Ele aponta ainda que é papel das escolas e das faculdades adotarem ações que valorizem a diversidade no processo educativo. “Isso inclui a formação continuada de professores sobre inclusão, acessibilidade e respeito às línguas e culturas, como a Libras. É essencial garantir acessibilidade comunicacional, física e pedagógica, com intérpretes, materiais adaptados e práticas bilíngues. O currículo deve refletir as múltiplas identidades dos estudantes, promovendo o diálogo e o protagonismo de grupos historicamente excluídos”.
O impacto do ensino de Libras na sociedade é evidente. O professor compartilha uma experiência marcante com um aluno ouvinte, que, após aprender a língua, conseguiu ajudar um colega surdo no ambiente de trabalho. “Ele tinha vergonha de errar e hesitava em se comunicar. Expliquei que o mais importante é a interação, independentemente dos erros. Depois disso, ele se sentiu mais seguro e consciente da importância da acessibilidade”, conclui Rafael.