Com direção de Claudia Schapira e dramaturgia de Marcelo Oriani, o espetáculo explora a polifonia para discutir os efeitos-causas da violência sexual
Créditos: Leandro Ivo |
Os impactos e consequências do abuso infantil pelo resto da vida de uma criança é o ponto central de Corte Seco, com texto de Marcelo Oriani e direção de Claudia Schapira, que tem sua temporada de estreia no Centro Cultural São Paulo (CCSP), de 20 de setembro a 5 de outubro. As apresentações acontecem no Espaço Ademar Guerra, de quinta à sábado, às 21h, e aos domingos, às 19h.
O espetáculo, que teve provocação cênica de Eliana Monteiro, traz no elenco Camila Fernandes, Nanddà Oliveira e Raquel Domingues. O texto foi contemplado pelo Prêmio Carlos Carvalho de Dramaturgia (2022) e ganhou menção honrosa no V Prêmio Ufes de Literatura (2023). E a temporada é realizada com recursos do ProAC 01/23 – Produção de Espetáculos Inéditos.
Corte Seco conta a história da cantora Poliana, que, depois de sofrer um acidente de carro, entra em coma e passa a recordar o abuso que sofreu pelo pai aos 7 anos. Nesse estado onírico do inconsciente, o presente, o passado e o futuro da cantora se enredam, enquanto ela passa sua memória a limpo.
A peça narra essa trama de maneira não-linear, com cenas que acontecem ao mesmo tempo em espaços e tempos distintos. “A dramaturgia proposta por Marcelo é uma cena polifônica, onde diversas personagens falam na cabeça da voz central. Ela é constituída por uma sequência de perguntas e afirmações, além de diferentes situações que sugerem lugares, acontecimentos e estados. E isso inspirou uma cena vertiginosa, um revezamento dessas vozes num jogo de narração, onde as atrizes comandam a ação.”, explica Claudia Schapira.
A dramaturgia é toda fragmentada, de modo que o público precisa completar à sua maneira as lacunas que ficaram na história. “Como a questão do abuso ainda não é uma questão resolvida socialmente, não faria sentido, para mim, resolver essa questão ficcionalmente. E essa fragmentação também se dá porque a narrativa utiliza o processo cinematográfico do corte seco – que é usado numa sequência de cenas que podem ou não acontecer ao mesmo tempo, mas em lugares distintos. Isso causa três efeitos: 1) deslocamentos temporais na cronologia da narrativa; 2) aumento de tensão da cena; 3) mudança dos pontos de vista sobre a narrativa”, revela o autor Marcelo Oriani.
Já a encenação tem forte influência do teatro hip-hop. “Venho trabalhando essa estética nos últimos 25 anos. A ‘palavra falada’ comanda a construção da cena a partir do ritmo que a própria palavra suscita criando nuances e camadas de significados. A poesia, o ritmo e a métrica narram. Essa dinâmica materializa, a partir da palavra falada, esses corpos no espaço. A palavra é corpo neste espetáculo. E o principal desafio foi compor as diversas figuras que desfilam ao longo da narrativa e que, pela fragmentação e a velocidade da troca, não daria tempo de construir personagens com precisão. O corpo, assim como o discurso, é fragmentado, lacunar, mas aterram essas vozes que falam pelo espaço. Neste espetáculo o gesto é lugar, é situação, é estado, é movimento, é discurso, e, por fim, é também dança”, diz a Schapira. Luaa Gabanini construiu a narrativa corporal com muita assertividade, e assina coreografia e a direção de movimento, elemento vital nesta posta em cena.
A ideia é suscitar o debate sobre o efeito-causa do abuso sexual infantil, mergulhando nesse tema-tabu a partir do campo da estética e da poética para promover um debate sério, honesto e responsável. “Sempre foi uma escolha consciente não dar voz para o abusador. O que vemos em cena são pessoas tentando lidar com o rastro que um abusador deixa na vida de alguém. E também é uma vingança poética: uma maneira de fazer esse silenciamento – que faz com que essa violência se perpetue e favoreça o abusador – se volte contra ele. E pode ser lido também como mais uma camada de denúncia justamente porque o abuso é o único crime onde a vítima se envergonha. Por isso opta pelo silenciamento, quase sempre. Porque há, historicamente, uma responsabilização da vítima. É preciso começar desresponsabilizar as vítimas pelas violências que elas sofrem”, conta o dramaturgo.
Ficha Técnica
DIREÇÃO
Claudia Schapira
DRAMATURGIA e ASSISTÊNCIA DE DIREÇÃO
Marcelo Oriani
ELENCO
Camila Fernandes
Nanddà Oliveira
Raquel Domingues
LIVE-DJ
Dani Hell
PREPARAÇÃO CORPORAL E
DIREÇÃO DE MOVIMENTO
Luaa Gabanini
TRILHA SONORA
Dani Nega
DESENHO DE LUZ
Rodrigo Palmieri
PREPARAÇÃO VOCAL
Sandra X
CENOGRAFIA
Juliana Fernandes
FIGURINOS
Rosângela Ribeiro
PROVOCAÇÃO CÊNICA
Eliana Monteiro
CENOTECNIA
Victor Akkas
Vinícius Ribela
ASSISTÊNCIA FIGURINOS
Neemias Villas Boas
OPERAÇÃO DE LUZ
Cláudio Gutierres
HAIR STYLE
Klay Fausto
INTÉRPRETE DE LIBRAS
Adriane Macarini (Sorriso)
DESIGNER GRÁFICO
Tami Lemos
ASSESSORIA DE IMPRENSA
Douglas Pichetti e Helô Cintra (Pombo Correio)
PRODUÇÃO GERAL
Rodrigo Palmieri e Leandro Ivo (Fulano’s Produções Artísticas)
ASSISTENTE DE PRODUÇÃO
Thauany Mesquita
Sinopse
Corte Seco é uma peça que, a partir de uma a sequência de cenas que acontecem ao mesmo tempo em espaços distintos desenvolve, de maneira não-linear, narra a história de Poliana – uma cantora que, após um acidente de carro, entra em coma e recorda o abuso que sofreu aos sete anos de idade. Presente, passado e futuro da cantora se enredam nesta narrativa enquanto ela passa sua memória a limpo.
Serviço
Corte Seco, de Marcelo Oriani
Temporada: 20 de setembro a 5 de outubro*
De quinta a sábado às 21h e domingo às 19h
*Sessões extras nos dias 28/9 e 5/10, às 19h
Centro Cultural São Paulo - Espaço Ademar Guerra – Rua Vergueiro, 1000, Liberdade, São Paulo
Ingressos gratuitos (retirar 1 hora antes na bilheteria)
Classificação: 16 anos
Duração: 60 minutos
Capacidade: 80 lugares
Acessibilidade: espaço acessível a cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida. Sessões com Intérprete de Libras nos dias 03 e 04/10, às 21h