Especialista na área indica quais são os direitos do paciente e o que fazer em caso de problemas
Lidar com questões de saúde pode ser algo difícil por si só, mas a burocracia dos convênios médicos tende a tornar tudo ainda pior. De acordo com dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar, que regula as empresas do setor, a não autorização de procedimentos e a negativa de reembolso de despesa médica são as duas queixas mais frequentes contra as operadoras de planos.
Ficar algumas horas, dias e até meses para resolver algo que deveria ser simples, tem entrado na rotina de beneficiários e prestadores de serviços médicos, frente a alta negativa de reembolsos, autorizações de procedimentos e, até mesmo, cancelamentos de contratos.
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Isso é reflexo não só da complexidade dos processos internos das operadoras, mas também de algumas condutas consideradas abusivas que vêm sendo praticadas pelas empresas. É o que explica o advogado Dr. Osvaldo Simonelli, advogado especialista em direito médico.
Ele conta que desde o final de 2022, por conta de uma decisão do STJ, que não modificou a lei, e seria aplicável apenas ao caso ali tratado, as operadoras passaram a impor condições que não estavam previstas no contrato com o consumidor, tal como a exigência de prova do desembolso prévio, não sendo suficiente a comprovação da prestação de serviços através da nota fiscal.
Contudo, mais recentemente, as operadoras de planos de saúde passaram a exigir também o envio de cópia do extrato bancário, do cartão de crédito, comprovantes de pagamento com o nome específico do paciente e com a data da consulta, além de relatórios médicos extensos, com obrigação de referência bibliográfica médica apenas para a liberação de exames de sangue.
Tais exigências são consideradas abusivas pelo advogado especialista em Direito Médico, Dr. Osvaldo Simonelli: “o paciente não é obrigado a abrir todo o seu histórico de saúde para um setor administrativo da operadora, violando assim o sigilo médico, a sua intimidade, seus dados pessoais sensíveis, apenas para um reembolso financeiro”.
Por outro lado, o advogado também alerta que as condutas das operadoras podem estar violando direitos e prerrogativas médicas, no sentido da autonomia profissional, além de violar diversas normas éticas, estabelecidas pelo Conselho Federal de Medicina.
“O Conselho Federal de Medicina estabelece diversas prerrogativas médicas, que são sagradas, tais como a autonomia profissional e o sigilo profissional, além de existir resolução específica que proíbe o médico quanto ao preenchimento de documentos elaborados pelas seguradoras, como é o caso do que vem ocorrendo”.
Toda operadora de plano de saúde possui um médico que é o Responsável Técnico, e este profissional responde perante o Conselho de Medicina por eventuais abusos cometidos pelas empresas. Isso vem sendo levado aos órgãos para análise, pois é inadmissível que, para a obtenção de um simples reembolso administrativo e financeiro, haja toda uma burocracia que viola diversos direitos de profissionais e consumidores.
As operadoras têm apontado diversas perdas financeiras em razão de supostas fraudes que estariam ocorrendo no setor de saúde, inclusive com matérias publicadas recentemente a respeito da sustentabilidade do sistema, o que é parcialmente contestado por Simonelli:
“Não há dúvidas de que existem fraudes, como em todos os setores da economia, infelizmente. Quer mais do que os bancos, que sofrem com fraudes diariamente? Agora, não faz sentido tirar os cartões de crédito do mercado, o sistema PIX, em razão das ilegalidades cometidas. O que as empresas devem fazer é instituir mecanismos de prevenção, mas sem violar direitos ou, ainda, adotarem práticas que buscam eliminar um sistema lícito, como é a livre escolha de prestadores, quando o contrato individual permite”.
Os médicos que trabalham para os planos de saúde, como auditores ou peritos, não podem limitar a escolha feita em benefício do paciente, pelo profissional que o acompanha, pois o Código de Ética Médica veda essa interferência.
A possibilidade de realização de juntas médicas é algo que está previsto na normativa da ANS, mas não pode sofrer qualquer desvio de finalidade, sendo uma ferramenta valiosa em prol do paciente, mas que, segundo informações da própria Agência, deve garantir a efetiva participação do médico que acompanha o paciente e jamais ser utilizada para procedimentos que não exijam autorização prévia ou situações de urgência ou emergência.
O especialista ainda alerta que: “As Juntas Médicas devem ser absolutamente imparciais nas análises, e não há previsão para a sua instalação sobre procedimentos que já foram autorizados ou já ocorreram e não demandavam autorização prévia, tais como exames laboratoriais. Lembrando que todos os médicos chamados para compor tais Juntas também estão sujeitos ao Código de Ética Médica”.
Os direitos dos beneficiários e dos médicos não podem sofrer limitações sob a alegação de atuação fraudulenta, como se todo um setor fosse responsável por algumas práticas irregularidades. A lei penal prevê as punições para os infratores, cabendo às operadoras estabelecerem medidas efetivas de controle, mas, sem incorrer em violações de outros direitos. “Não se pode utilizar medicamentos que matem o paciente junto com a doença”, conclui o especialista.