Naquele distante 1951, as radionovelas se preparavam para comemorar dez anos de absoluto sucesso no rádio brasileiro, com toda uma geração de atores tarimbados que eram verdadeiros ídolos das donas de casa. Na PRF-3 TV Tupi de São Paulo, o "Teatro Walter Forster" e o "Grande Teatro Tupi" já eram também um grande sucesso, exibidos uma vez por semana.
Acostumado a escrever muitos desses teleteatros, Walter Forster teve uma grande idéia, imediatamente apoiada pelo jovem Cassiano Gabus Mendes, responsável pela programação da emissora: escrever uma novela em capítulos que seria apresentada duas vezes por semana. A idéia era emocionar a população, principalmente as mulheres, que já representavam uma boa parcela daqueles assíduos telespectadores.
Segundo o próprio Walter Forster declarou em uma entrevista, "pensei em um grande romance, com um intenso triângulo amoroso. As mulheres adoram um romance, principalmente quando ele tem muitos empecilhos. Desde o início imaginei um grande final, quando o galã tinha que escolher com qual das duas ficaria, selando essa paixão com um beijo apaixonado".
Falar em um último capítulo de novela tendo como grande atração um beijo do herói e da mocinha parece, nos dias de hoje, eternamente piegas e sem o menor interesse, já que nas nossas novelas em pleno século XXI, as cenas de tórridos romances na cama começam já nos primeiros capítulos. Mas naquela época, só falar em um possível beijo inocente no último capítulo já foi suficiente para abalar as estruturas do prédio da emissora no Bairro do Sumaré.
Vida Alves na TV Tupi, 1950 Como conta
Vida Alves, até hoje a grande batalhadora pela preservação da memória da TV Tupi e dos primeiros anos da nossa TV, e que é presidente do movimento Pró-TV, "Walter Forster teve que insistir muito com o Demerval Costa Lima e os outros diretores da emissora, na época, até convencê-los de que o beijo era muito importante e seria um marco na história da nossa televisão". E Vida tem autoridade suficiente para falar sobre o assunto, afinal de contas, foi ela a heroína a receber o primeiro beijo de um galã em uma novela, e esse galão era nada mais nada menos do que Walter Forster.
A primeira novela brasileira se chamou
"Sua Vida Me Pertence", com texto e direção de Walter Forster e um elenco onde além de Forster e Vida Alves estavam Lia de Aguiar, José Parisi, Lima Duarte, Néa Simões, Dionísio de Azevedo, João Monteiro, Tânia Amaral e Astrogildo Filho.
Sua Vida me Pertence O mais interessante é que a primeira novela já chegou criando polêmicas. Além do beijo, é claro, o enredo revolucionava o eterno triângulo amoroso, já que o galã escolhia no final a jovem mais brejeira e avançada, digamos assim, "a outra", que era vivida por Vida Alves, deixando de lado a noiva certinha e muito comportada, que era interpretada por Lia de Aguiar.
Cada capítulo tinha 20 minutos de duração e a novela ficou no ar de 21 de dezembro de 1951 a 15 de fevereiro de 1952, sempre às terças e quintas-feiras. Um enorme sucesso que fazia as mulheres suspirarem e os homens ficarem com inveja do Walter Forster. Escândalos à parte, estava definitivamente plantada a semente de um gênero que nenhum outro país do mundo domina tão bem como nós: a telenovela.
Na próxima semana, a PRF-3 de São Paulo ganha sua primeira concorrente.