Colunistas - Rodolfo Bonventti

Era uma vez na TV: Telespectadores, a palavra que deixou em pânico uma grande atriz

1 de Setembro de 2010
No primeiro ano da TV no Brasil, aquele aparelhinho com "alta" tecnologia chamava a atenção de todos, só que ele ainda era um sonho muito distante. Nessa época, início da década de 1950, um televisor custava 9 mil cruzeiros, uma pequena fortuna naqueles tempos, quase quatro vezes mais do que uma boa vitrola, até então o aparelho que dominava as salas da nossa sociedade.



Em um ano de vida, a TV só podia ser vista por pouco mais de 400 famílias brasileiras, mas fez surgir nos nossos dicionários uma nova palavra: telespectador - a pessoa que assiste a um programa de televisão.

E foi naquele 18 de setembro de 1950, que uma jovem radioatriz pertencente ao elenco das Rádios Tupi e Difusora, ganhou uma das maiores responsabilidades da televisão brasileira: falar ao vivo, sem pestanejar ou gaguejar, de uma vez, todos os prefixos das emissoras associadas, que já eram muitos, e cumprimentar e reverenciar os novos ouvintes, que agora ganhavam um novo termo: telespectadores.

Essa jovem atriz era Yara Lins (1930-2004), que se transformaria em uma das mais premiadas atrizes da nossa TV. Em uma entrevista dada na década de 90 em comemoração aos 45 anos da televisão, Yara declarou: "não era uma palavra, era um palavrão! A gente vinha do rádio onde se lia um script , onde se falava várias vezes ao dia a palavra ouvintes, e de repente eu tinha que falar ao vivo, sem nenhum papel na mão e de forma calma e tranqüila aquela palavra imensa: telespectadores. Eu acho que fiquei quase uma semana para conseguir falar toda a frase sem pestanejar e ficando calma".


Yara Lins

E foi Yara Lins quem surgiu pela primeira vez anunciando que a nova emissora estava no ar: "Senhoras e Senhores Telespectadores, neste momento as Emissoras Associadas do Brasil... e aí vinham todos o prefixos até chegar na PRG2- Rádio Tupi de São Paulo; PRF3 - Rádio Difusora de São Paulo e PRF3 Tevê, Canal 3, apresentam, neste instante, orgulhosamente, sob o patrocínio de Companhia Antarctica Paulista, Moinho Santista, Organização Francisco Pignatari e Sul América Seguros de Vida e suas subsidiárias, o primeiro programa de televisão brasileiro."

Segundo a atriz, "eu estava em pânico, mas disse tudo de uma vez, sem gaguejar ou mudar o tom da minha fala em qualquer momento. E não errei nada, nem aquela maldita palavra, telespectadores. Foi ai que eu percebi que tinha na minha memória, uma excelente aliada, que aliás me ajudou a decorar textos e mais textos pelo resto da minha carreira".

Para muitos daqueles radioatores, acostumados a trabalhar apenas com as tonalidades da voz, já que o texto vinha todo pronto e bastava lê-lo, a televisão representava o grande exercício da memorização, pois a partir daquele momento, era necessário decorar tudo e sempre gravar ao vivo, sem direito a cometer erros.

Outra grande radioatriz daquela época e também uma das nossas principais estrelas e apresentadoras da TV nos seus primeiros anos, Lia de Aguiar (1927-2000), dizia "nós nos atiramos àquela novidade como uma criança que ganha um brinquedo novo. Era tudo uma grande loucura, mas uma loucura linda, maravilhosa. Nós nunca tínhamos visto uma câmara de tv antes e nem sabíamos como gravar para uma delas. Nós apenas sabíamos falar bem como radioatores que éramos, e todo o resto tivemos que aprender na raça. Por isso a TV Tupi foi o grande celeiro de atores deste país".


Lia de Aguiar

O primeiro passo estava dado. Com o boa noite as senhoras e aos senhores telespectadores de Yara Lins, não tinha mais volta, a telinha estava definitivamente no ar e invadia as primeiras noites dos brasileiros. Mas e o que veio depois?

Bem, isso é assunto para a semana que vem. Até lá!
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